sábado, agosto 26, 2006

Organização Internacional de Intersexuais em lingua portuguesa


Dra. Waleria Torres, M.S., Ph.D.
Gendercare Gender Clinic
Portavoz da OII-Organização Internacional de Intersexuais em lingua portuguesa.


Nasci na cidade de São Paulo, Brasil, em 1950.
Fui reconhecida e registrada como um menino. Oficialmente, até hoje, quem é registrado como menino no Brasil, não pode mais mudar o registro, que é considerado certo e infalível.

Com 17 anos entrei na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, como um menino. Estudei e me formei como um menino. Trabalhei e continuei estudando como um menino.

Me casei com uma bela mulher como um menino, e tive filhos, sendo pai como um menino. Me separei e me casei de novo com uma advogada absolutamente fascinante. Tive mais um filho, como um menino. Ela foi embora com a criança, um dia.

O engenheiro queria morrer. Pensou em se tornar um padre católico, foi convidado pela arquidiocese para estudar teologia.

Na véspera de entrar no seminário definitivamente optando por ser padre e quem sabe monge beneditino... sua natureza íntima feminina, que sempre fora sufocada mas desde a mais tenra infância estivera lá... apareceu e protestou: E eu?

Waléria surgiu naquele dia... não com esse nome. Sem um nome eu poderia ter muitos nomes. Aos 6 para 7 anos de idade sonhei que era Martha. Assim surgiu a Martha e depois Camilla e depois... Waléria, entre outros nomes. Eu diria que meu nome mais "oficial" hoje é Waléria.

Não podia continuar trabalhando com engenharia. Abandonei radicalmente mais de 20 anos de profissão, todos os antigos contatos... perdi muito dinheiro... abri mão do muito que tinha, para ser enfim eu mesma.

Precisava desenvolver uma nova carreira... precisava sobreviver com mais de 40 anos de idade... e em transição ainda por cima.

Fui estudar a dinâmica da formação da identidade de gênero... primeiro na Biblioteca da Bireme em São Paulo, ligada à Faculdade Federal de Medicina de São Paulo. Estudei mais de 2 anos, e escrevi meu primeiro livro sobre o assunto usando o pseudonimo de Martha Freitas: "Meu Sexo Real - a origem inata, somática e neurobiológica da transexualidade", publicado em 1998 pela Editora Vozes.

Participei de "talk shows" na TV brasileira, em rádios.

Passei por uma cirurgia de readequação sexual MtF em 1997, pelo Dr.Jurado, PhD.
Recebi convites para dar aulas em cursos "lato sensu" de pós-graduação sobre disforias de gênero no SBRASH - Soc. Bras. Estudos em Sexualidade Humana, em 1999, e depois resolvi me submeter a um exame para bolsa da CAPES para Mestrado em Sexologia na UGF-Universidade Gama Filho no Rio de Janeiro.

Bolsista, consegui em 2002 meu "cum laudae" da banca formada por Dr. Pedro Jurberg, PhD (neurobiologia); Dra.Marise Jurberg, PhD (psicologia) e Dra. Suzana Herculano-Houzel, PHD pela Universidade de Paris (neurobiologia). Me tornei mestre em sexologia com a dissertação : Gênero, do Mito à Realidade.

Participei em 2001 do XV Congresso Mundial de Sexologia em Paris, onde apresentei dois trabalhos, e muitos de diferentes países me solicitaram: compartilhe seu conhecimento, nesses casos estranhos não sabemos o que fazer.

Assim em 2001 fundei a Gendercare Gender Clinic, em 2002 passei a integrar como membro titular a HBIGDA-Harry Benjamin International Gender Dysphoria Association, e agora em 2006 fui convidada e aceitei com muita honra e prazer, fazer parte do "board" da OII- Organização Internacional de Intersexuais, como portavoz dessa sociedade para países em lingua portuguesa.

Não mais como um menino, mas como uma menina.

Durante este perído de estudos e de trabalho em variâncias de gênero as mais variadas, tenho percebido que na realidade o gênero, como auto-percepção da própria realidade existencial, abrange uma enorme diversidade, que transcende e muito qualquer classificação simplista de duas polaridades apenas. Existe um campo, o que defino um "Rspaço de Gênero", e nesse espaço se pode ser mais M - masculino, mais F - feminino, ou podemos viver num estado intermediário, e a formação dessa identidade, dinamicamente, pode ser estudada e conhecida.

Minha matemática, meu conhecimento de psicologia e filosofia... tenho usado para desenvolver esse conhecimento em sexologia, para aplicar em terapia de gênero.

Obrigada,
Rio de Janeiro, 17 de Agosto de 2006.

4 comentários:

sissimaltaneves disse...

Estimada DRa. Waléria
Encontrei sua Gidschool ao procurar material para terminar de escrever artigo sobre gênero e direitos humanos, pois pesquiso sobre Homofobia e cidadania GLBT. Resido em Porto alegre, sou psicóloga clínica, professora universitária (FFCMPA, URCAMP), pesquisadora. Sou pós-graduada como diretora de Sociodrama e Psicodrama pelo Centro Zerka Moreno de Sociodrama e Psicodrama(Argentina), Especialista em Psicologia do Desenvolvimento (UFRGS, Mestre em Psicologia Social e da Personalidade (PUCRS). Desde 1984 pesquiso sobre as possibilidades do psicodrama referentes a àrea da exclusão social (jovens em situação de risco, educadores sociais,ecologia). Pesquiso a construção de redes sociais para a emergência de uma nova comunidade. Desde 2004 realizado intervenções comunitárias utilizando o recurso do Sociodrama em diversos segmentos sociais (eventos de movimentos sociais,universidades, congressos) com o objetivo de lutar contra a Homofobia. Ao ler essa página me surpreendi com sua trajetória de vida, sua luta maravilhosa e imaginei a pessoa incrível que sejas.Gostaria de poder conhecer mais de perto sua escola e seu trabalho. Parabens milhl~es de vezes!
Pediria seu contato por e-mail particular.
Sissi Malta Neves
Meu contato: maltanev@terra.com.br
REDES - Clínica e Pesquisa em Psicologia Social e Psicodrama
Rua João Abott, 257 sala 502 Porto Alegre Bairro Petrópolis Cep 90460-150

Susan Vaz disse...

Dra. Waléria a senhora não deixou claro se nasceu biologicamente com ambos os sexos. Se nasceu hermafrodita ou se sua referência é de transgênero.São situações diferentes e embora tenha entendido sua tese que aborda ressaltando a forma dinâmica como a construção da identidade sexual vai sendo construída, a realidade é que existem fatores diversos que não podem ser ignorados já que o tema implica em referências tanto de foro particular quanto para nutrir de conteúdo e argumentos as inúmeras bandeiras sociais surgidas em torno da questão da sexualidade. Aguardo o seu contato.

Susan Vaz disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Susan Vaz disse...

Como posso enviar email ou telefonar para a senhora? Pois é exatamente uma instituição assim que procuro. Qual o contato?